O mercado global de bem-estar está em um novo momento de hype. Diferentemente de movimentos anteriores pautados por alimentação natural, mindfulness e exercícios físicos, o crescimento atual vêm com base em uma espécie de “ciência fabricada” ou, como definiu um pesquisador canadense Timothy Caulfield, scienceploitation.
Analistas também dizem que vivemos o boom da fake science.
Essa tendência combina marketing agressivo, termos médicos ambíguos, endossos de celebridades e uma estética de autoridade científica para promover produtos que, em muitos casos, não têm comprovação clínica robusta, mas prometem tudo, de “detox de pele” a “equilíbrio hormonal”, passando por imunidade fortalecida e rejuvenescimento celular.
Mas não só. A fake science também é fundamentada por artigos científicos verdadeiros. No entanto, essas publicações científicas ou tem referências bibliográficas duvidosas ou são muito enviesadas e apresentam conclusões a partir de contextos muito específicos que não servem para vender algo em escala global.
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O mercado bilionário sustentado pela fake science
O setor global de bem-estar é estimado atualmente em US$4,5 trilhões, segundo o Global Wellness Institute. Dentro desse universo, a indústria de suplementos movimentou US$50 bilhões apenas nos Estados Unidos a partir de 2021, mesmo com diversos estudos mostrando que a maioria desses produtos é desnecessária para pessoas com alimentação equilibrada.
O crescimento também pode ser visto na indústria de beleza e cuidados pessoais, que ultrapassou US$600 bilhões globalmente em 2022, segundo a Statista. Nesse segmento, o uso de termos como “médico”, “clínico” ou “baseado em evidências” se tornou frequente mesmo em produtos vendidos sem prescrição, como cremes faciais e bebidas “funcionais”.

O vocabulário da fake science
Palavras como “probiótico”, “adaptógeno”, “bioativo”, “detox”, “prebiótico”, “clínico” e “medicinal” ganharam status de selos de confiança ainda que, na prática, não estejam acompanhadas de evidências científicas sólidas.
Segundo um estudo publicado em Science Advances (2021), pessoas que confiam fortemente na ciência são mais propensas a compartilhar informações falsas com jargões científicos do que aquelas que não têm esse viés.
O estudo aponta que a linguagem técnica cria um efeito de autoridade, mesmo quando o conteúdo carece de fundamentação.
Essa dissonância entre percepção e realidade é propicia estratégias que não mentem, mas exageram, omitem ou manipulam a apresentação dos dados. Um exemplo comum: incluir vitamina C em cosméticos em quantidades inferiores ao mínimo necessário para gerar qualquer efeito. Esta é uma prática conhecida no setor como science washing.
Celebridades, redes sociais e o novo selo de aprovação
Influenciadores e celebridades se tornaram peças-chave na difusão de práticas que, embora sem respaldo científico, conquistam milhões de seguidores. De tratamentos como “vampire facials” a práticas como “perineal sunning”, o valor da imagem muitas vezes suplanta o da eficácia.
Esse movimento ganhou ainda mais força durante e após a pandemia de Covid-19, quando a crise de confiança nas instituições e na medicina tradicional abriu espaço para discursos alternativos.
Como resultado, surgiram fenômenos como a popularização de tratamentos intravenosos de vitaminas, colonoterapia, consumo de carvão ativado e promessas de “imunidade turbinada”.
Sinais de alerta no rótulo
Entre as estratégias mais comuns observadas por especialistas estão:
- Listas infladas de ingredientes com compostos exóticos ou em quantidades insignificantes;
- Termos vagos como “clinicamente testado” ou “baseado em ciência” sem citar estudos;
- Referência a “estudos” ou “pesquisadores” sem identificação ou validação;
- Influenciadores pagos que promovem produtos sem transparência sobre parcerias.
O custo do entusiasmo
Além do impacto financeiro, como o caso de suplementos que podem custar até US$ 700 por ano quando versões similares custariam menos de US$ 15, segundo o New York Times, há riscos reais à saúde.
Casos de queimaduras causadas por técnicas como “sunning” ou agravamento de quadros clínicos por abandono de tratamentos convencionais para seguir terapias alternativas têm se tornado mais comuns, como alertam médicos e estudos clínicos.
Um levantamento da Kaiser Family Foundation mostrou que entre 50% e 75% do público não consegue distinguir verdades de mitos sobre temas de saúde, reforçando o desafio da desinformação.
A saúde real continua acessível
No fim das contas, o que especialistas continuam recomendando é o que quase sempre funcionou: dormir bem, manter relações saudáveis, ter uma alimentação balanceada e praticar atividade física regularmente. Nada disso precisa ser vendido em cápsulas, cremes ou terapias de luxo.
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