O não ser do ser Barbie
Contrariando a coluna passada, ouso aqui me aproveitar do “swell”, ou melhor, do tsunami de análises a respeito do recém-lançado “filme da Barbie”. Obviamente, não entrarei em pormenores a respeito de seu roteiro ou execução, visto que não assisti a obra cinematográfica. E ainda que tivesse assistido, não teria arcabouço intelectual para tanto.
Por aleeenot/envato
Provavelmente não o verei, por não fazer parte do público-alvo a quem se destina o filme, o que acontece não em função de critérios de segmentação de mercado ligados a demografia, como gênero ou renda, por exemplo. O critério excluidor do segmento é meramente de ordem psicográfica.
Sendo assim, o que me resta é tentar analisar o lançamento do referido filme tendo como viés principal questões mercadológicas associadas ao contexto do lançamento de um produto. Sim, antes de tudo, a “boneca e o filme da boneca” são produtos. Qualquer análise que desconsidere esse fato pode ser classificada como insana e descabida.
Entretanto, “a boneca e o filme da boneca” podem ir além de um produto. Tudo gira em torno da marca Barbie, ao contexto de seu surgimento, sua trajetória e à chegada aos tempos atuais. Por sinal, se fosse humana, o referido brinquedo não seria mais uma menina, mas uma senhora de 67 anos. Como será que ela seria? Não vou cair na tentação dessa ilação, visto que posso tomar uma “vaca na cabeça” de uma série de ondas desgovernadas da internet.
Antes de tudo, uma marca é um conjunto de ideias, em parte “juntadas” de forma proposital, em parte adicionadas de forma inesperada e incontrolável. Essa somatória de ideias gera, por consequência, um conjunto de significados e um conjunto de associações. Logo, não se trata somente de um produto, mas também de uma marca que, presente no mundo, pode ou não agradá-lo.
A partir daí surgem as “análises profundas da internet”. Algumas dedicadas a questões técnicas ligadas a roteiro, produção e/ou pós-produção, como era de se esperar. Outras vão em direção ao mundo dos negócios, comentando bilheteria, custos de produção, repercussão nas redes sociais, situação financeira da Mattel, dentre outras coisas. E, como não poderia deixar de ser, chegam também as análises de ordem social, psicológica, filosófica, antropológica, e de todas essas juntas.
Em maior ou menor grau, isso acontece com qualquer lançamento de um filme cinematográfico, ainda mais quando quem promove a obra sabe que algumas questões incorporadas à mesma podem gerar o referido tsunami de “análises profundas”. Umas chegam a dizer que o filme será a salvação financeira da Mattel, outras chegam de forma inacreditável à associação do filme com a questão da liberação do aborto. Em tempo: parece que alguns colunistas escrevem para si mesmos, não é possível.
Nada contra tais análises, mas poucas valem como aprendizado de algo. E encontrar as que valem dá um trabalho danado. Assim como nos filmes, existem as boas e as ruins. Algumas são dramáticas, outras são românticas, outras ainda cômicas ou, literalmente, um terror. E outras ainda parecem ser pornográficas, tamanha a ausência de um roteiro lógico de argumentos minimamente mínimo. Seja como for, elas existem e isso faz com que o “produto mais marca, boneca mais filme da boneca” seja um sucesso de bilheteria.
Não se trata somente de uma boneca, mas de um filme sobre essa boneca, que é capaz de gerar um conjunto de repercussões, que naturalmente é originado em função da história de uma marca, cuja potência é grandiosa em termos de significados e associações, e que propositalmente é gerado por alguns “temperos da moda” (vulgo questões polêmicas do mundo atual) adicionados ao roteiro do filme. Essa é a lógica por trás de tudo. Meticulosamente pensado, articulado, arquitetado e construído. Se existe algo que o estudo de marketing te ensina para a vida é não ser inocente.
Tudo isso me leva, como professor, a ir ver o filme. Não por mim, mas para poder debatê-lo junto a meus queridos alunos sob a ótica da fenomenologia mercadológica. Ainda assim, haverá grande resistência. E saiba você, acidental leitor(a) dessa coluna que a função de professor me obriga a ler de tudo, ainda que saiba logo na primeira linha que as demais não valem o esforço nem o tempo dedicados a isso. Ossos do ofício.
Como diria São Tomás de Aquino: “Na vida, existe aquilo que você quer, aquilo que você acredita e aquilo que você precisa fazer”.
Muitas vezes, ou na maioria das vezes, essas três coisas não são coincidentes.
Não vejo a hora de ver a nova versão de Missão Impossível.
Ricardo Poli é professor, palestrante, provocador, piadista e colunista da BRING ME DATA.
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As opiniões aqui contidas são de responsabilidade de seu autor e não refletem necessariamente a opinião da Bring Me Data e do blog da Macfor.