Ferrari na Venezuela: vendas a todo vapor
Recentemente, os sites da BBC e da Bloomberg Línea divulgaram matérias a respeito das ilhas de riqueza na Venezuela. Sim, existe riqueza para além do petróleo naquele país. O acidental leitor dessa coluna pode encontrar mais detalhes a respeito dessa realidade nas respectivas reportagens.
Cassinos no padrão Las Vegas, empreendimentos imobiliários exóticos, hotéis e restaurantes sofisticados, lojas de marcas de moda e cosméticos iguais as de Paris, Nova York, Pequim ou Milão e, como não poderia deixar de ser, uma da concessionária da Ferrari são os grandes ativos simbólicos de um oásis chamado Las Mercedes, além de outras regiões pouco menos famosas.
Obviamente, a força da marca italiana faz com que ela seja a protagonista de qualquer reportagem que se dedique a discorrer sobre luxo e sofisticação, seja qual for o contexto, para o bem e para o mal. O mesmo acontecia com a famosa marca americana de fast food em relação a protestos antiglobalização ou com aquela outra marca americana de refrigerantes de cola quando se discorria sobre os avanços do capitalismo pelo mundo em tempos de Guerra Fria.
À primeira vista, é mais do que evidente que a marca Ferrari e a marca Venezuela nada têm em comum. Sim, países também são marcas, visto que seus nomes carregam consigo um conjunto de significados e associações.
Mais do que isso, as marcas italiana e venezuelana, de chofre, podem ser percebidas como antagônicas quando postas frente a frente. Como sempre, o autor dessa coluna não vai subestimar a inteligência de seus acidentais leitores com a descrição detalhada de ambas.
O que chama a atenção, especificamente na reportagem da Bloomberg Línea, é a narrativa dada pelo gerente de vendas da Ferrari ao tentar justificar que os automóveis da marca só são adquiridos por pessoas que o fazem com dinheiro lícito: “Será que alguém com dinheiro fácil vai apreciar algo tão exclusivo (não porque é caro, mas porque é exclusivo)? Eles vão preferir comprar outra coisa.”
Talvez, o “ingênuo” gerente de vendas desconheça a força da marca dos produtos que vende. Mesmo porque, dinheiro ilícito não é necessariamente dinheiro fácil. Vale lembrar, também que muitos herdeiros compradores de Ferrari não fizeram o mínimo esforço para juntar um dinheirinho ao longo de décadas para comprar seu carro italiano dos sonhos.
Além disso, tal ingenuidade faz com ele esqueça dos inúmeros casos de grandes senhores do dinheiro ilícito possuidores dos carros esportivos de Maranello, tão noticiados ao longo da história.
Acredito que um dos principais motivos que leva à aquisição dos referidos automóveis italianos seja a sensação de exclusividade. Mas isso nada tem a ver com a origem do dinheiro responsável por fazer isso acontecer.
O gerente de vendas precisa conhecer mais a mística da marca dos produtos que vende e o quão desejada é por quem quer que seja, ainda que saiba que jamais a terá. E deve torcer para que nenhum diretor italiano leia tal reportagem, para garantia de seu emprego.
Por fim, algum acidental leitor pode ter criado a expectativa de que esse colunista fizesse alguma reflexão a respeito do contexto contraditório das marcas Ferrari e Venezuela. Não o fiz porque o fato descrito nas reportagens não me surpreendeu de forma relevante, visto que se trata exatamente do que acontece nesse país que vivemos e em outros tantos ao redor do planeta.
Ricardo Poli é professor, palestrante, provocador, piadista e colunista da BRING ME DATA.
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As opiniões aqui contidas são de responsabilidade de seu autor e não refletem necessariamente a opinião da Bring Me Data e do blog da Macfor.