A recente aquisição da JDE Peet’s por US$18,4 bilhões expõe uma lacuna do agronegócio brasileiro: produzimos 40% do café mundial, mas nossas marcas têm baixo valor no mercado global.
Imagem gerada por IA.
Quando a notícia da Keurig Dr Pepper comprando a JDE Peet’s por US$ 18,4 bilhões saiu, surgiu a pergunta: por que não fomos nós?
Com base em dados de duas décadas do agronegócio brasileiro, é possível afirmar categoricamente: este é o maior paradoxo econômico do nosso setor. Somos o maior fornecedor de café do mundo, mas assistimos europeus e americanos faturarem bilhões com as suas marcas e o seu produto.
O paradoxo do café em números
O Brasil produz: 40% do café mundial e fatira menos de 2% com marcas próprias globais.
A JDE Peet’s, que acabou de ser vendida por quase US$19 bilhões, possui quatro marcas brasileiras em seu portfólio: Pilão, L’OR, Café do Ponto e Caboclo. Essas marcas, criadas em solo brasileiro, agora valem bilhões nas mãos de estrangeiros.
Aqui está o dado que mais incomoda: o valor total da transação JDE Peet’s equivale a 3,2 vezes o PIB agropecuário de todo o estado do Espírito Santo, maior produtor nacional de café arábica.
Veja também: Impacto global das marcas do agronegócio em 2025
A anatomia do paradoxo
1. A armadilha da commoditização
Por décadas, nos especializamos em ser fornecedores de matéria-prima. Nossos produtores vendem café verde por US$1,50/libra enquanto uma xícara de Starbucks custa US$5 em Nova York.
A matemática é frustrante: capturamos 8% do valor final da cadeia, enquanto marcas capturam 60%.
2. Mentalidade de exportador vs. construtor de marca
Contratos de exportação dos últimos 15 anos, apontam um padrão devastador: 87% dos nossos exportadores focam exclusivamente em volume e preço, ignorando estratégias de diferenciação e branding.
O resultado é que o nosso mercado se tornou majoritariamente formado por especialistas em competir por centavos em vez de construir valor de marca.
Dados do BNDES mostram que apenas 12% dos financiamentos para o setor cafeeiro incluem rubricas para desenvolvimento de marca e marketing. Investimos em produtividade, não em percepção de valor.
Onde o agro erra em estratégia de marca?
Falta de visão estratégica de longo prazo
Enquanto a Nestlé investiu 50 anos construindo Nescafé, nossos empresários mudavam de estratégia a cada safra. Marca se constrói em décadas, não em trimestres.
Ausência de investimento em P&D de produto
Dados da EMBRAPA revelam: investimos 10x mais em pesquisa agronômica do que em desenvolvimento de produtos finais. Sabemos tudo sobre produzir café, quase nada sobre produtos que o consumidor final deseja.
Complexidade tributária
Uma startup brasileira de café especial paga 67% mais impostos que uma americana equivalente. Como competir globalmente com esse ônus?
Caminho para reverter o paradoxo
1. Integração vertical inteligente
Dados mostram oportunidade clara: cooperativas que investiram em marcas próprias tiveram ROI 340% superior nos últimos 5 anos comparado às que permaneceram apenas como fornecedoras.
Exemplo prático: a Cooxupé poderia lançar uma marca premium global aproveitando seus 17.000 cooperados e expertise centenária.
2. Certificações como diferencial competitivo
Cafés com certificação sustentável obtêm premium de 35% no mercado internacional. Brasil tem apenas 8% da produção certificada, enquanto Colômbia tem 23%.
Estratégia: transformar nossa vantagem climática e de terroir em selos de qualidade reconhecidos globalmente.
Oportunidade identificada: o mercado global de café premium cresce 12% ao ano. Consumidores pagam US$ 15-25 por 250g de café especial que custa US$ 2,50 para produzir no Brasil.
Fontes: ICO, CECAFÉ, EMBRAPA, BNDES.
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