O atual universo das empresas de tecnologia impressiona pela velocidade de seus avanços e inovação, seja lá o que isso signifique de fato. Também impressiona a ordem de grandeza dos investimentos movimentados nessas atividades. Essa obviedade também vale para o inverso desse contexto, onde grandes investimentos são dedicados a pesquisa e desenvolvimento de produtos por um longo período de tempo e que, por razões óbvias e “não óbvias”, são sumariamente descartados.
E nada mais emblemático a respeito dessa dicotomia do que as recentes notícias a respeito da Xiaomi e da Apple. A chinesa acaba de lançar seu automóvel elétrico, o SU7. O mais novo brinquedinho da empresa é capaz de alcançar 265km/h de velocidade final e atingir 100km/h em 2,78 segundos. O design é “bem bonitinho” e a tecnologia embarcada do mais alto nível. Será disponibilizado em três versões: SU7, SU7 Pro e SU7 Max.
Em tempo: qualquer semelhança é mera coincidência.
Segundo o relatado pelo Meio&Mensagem, o investimento da Xiaomi neste projeto foi de €1,3 bilhão, cerca de R$7,0 bilhões, e envolveu mais de 3,4 mil engenheiros, além de mais de mil especialistas em áreas-chave correlatas.
A concepção do automóvel, em termos tecnológicos, é a integração “humanos-casa-carro”, algo que esse velho professor de marketing rabugento nem ousa tentar escrever a respeito, tamanha a variedade e a complexidade de termos técnicos e benefícios decorrentes. Prefiro deixar essa tarefa para as meninas da Macfor.
O fato inevitável é que a empresa chinesa agora é reconhecida também por sua ousadia.
Por mais incrível que possa parecer, o lado oposto desse contexto vem da Apple. A americana anunciou recentemente que, após 10 anos dedicados ao desenvolvimento de seu automóvel elétrico, decidiu abandonar o projeto. O departamento responsável pela empreitada envolve um time de 2.000 pessoas e consumiu bilhões de dólares nesse período. Pessoas serão realocadas, pessoas serão demitidas.
A desistência foi até motivo de chacota por ninguém menos que Elon Musk, que mandou um “tchauzinho” pelo X ao comentar a notícia.
A concepção da aposta da Apple girava em torno de um carro elétrico autônomo, com interior “bonitão” de Limousine e navegação por voz. A estimativa do preço final era algo em torno de US$100 mil. Seus executivos concluíram, recentemente, que tal preço não seria suficiente para alcançar as margens de lucro que a empresa da maçã costuma ter normalmente em seus produtos. Uma década para descobrir isso?
O preço do SU7? A partir de US$30mil em território chinês.
Isso posto, vale a reflexão a respeito de uma outra característica que as empresas fabricantes de produtos tecnológicos são marcadamente reconhecidas: a antevisão. Em outras palavras, a capacidade que supostamente elas têm de “captar” tendências, seja lá o que isso signifique de fato, bem como de “prever” o futuro. Por sinal, muitas delas falam mais do futuro que do presente em suas ações de comunicação mercadológica.
Ouso arriscar afirmar que essa obsessão futurista, fruto do avanço tecnológico gerador de atributos e benefícios para as mais variadas categorias de produto, é o principal motivo do fracasso de inúmeros deles. Em outras palavras, recursos tecnológicos são desenvolvidos, testados e aplicados muitas vezes sem considerar o fundamento existencial de um produto: atender necessidades e desejos. Criam-se recursos e não se sabe o que fazer com eles. Mas já que foram criados, que sejam aplicados.
Meu caro(a) leitor(a) acidental, responda com toda sinceridade: “onde estão guardados os óculos 3D que vieram junto com a TV que você comprou para ver a última Copa do Mundo? Quantos de vocês compraram aquela TV moderninha com tela curva? E os óculos de realidade virtual, já comprou o seu? Onde foi parar o metaverso?”
O automóvel da Xiaomi é efetivamente um carro. O automóvel da Apple, uma aposta perdida no futuro.
Ricardo Poli é professor, palestrante, provocador, piadista e colunista da BRING ME DATA.
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As opiniões aqui contidas são de responsabilidade de seu autor e não refletem necessariamente a opinião da Bring Me Data e do blog da Macfor.