A coluna dessa semana tem sabor especial. Muito especial. Jamais esse velho professor de marketing rabugento imaginou que algum dia iria se tornar um escrevinhador periódico de um periódico. Inimaginável também seria chegar à marca dos 50 textos raramente lidos por acidentais frequentadores desse espaço cibernético. Confesso que me vem à alma um certo pequeno orgulho.
Até mesmo a conjunção dos astros mercadológicos jogou a favor do referido cinquentenário. Escrever sobre cerveja é muito mais saboroso do que escrever a respeito de perfumes ou sobre o BBB. Tenho absoluta certeza que as poderosas meninas da MACFOR não foram as responsáveis por essa prodigiosa coincidência. Santos astros!
E por falar em santidade, se comemora, mais uma vez no próximo dia 17/3 a existência de São Patrício, o famoso santo irlandês que não era irlandês. Sua história é repleta de pequenos enredos entrelaçados que, ao longo de tempo, culminam atualmente numa grande festa de cinco dias na Irlanda. Nesse dia, por lei de âmbito nacional, é proibido que os bares permaneçam fechados.
Ouso afirmar que se trata de um modo evoluído para comemoração de uma data santa. As melhores cervejas do mundo foram criadas por entidades religiosas. Vale o estudo curioso a respeito das cervejas fabricadas pelos monges trapistas em suas abadias milenares na Bélgica.
Bebidas alcóolicas estão intrinsicamente ligadas ao cristianismo. A Santa Ceia foi regada a vinho. O primeiro milagre do barbudo mais famoso da história da humanidade foi transformar água em vinho. Se você se diz cristão e não bebe, você não é um cristão em plenitude. Está incompleto.
E, como não poderia deixar de ser, a comemoração irlandesa de São Patrício é regada, principalmente, pela cerveja padroeira desse país, a Guinness. Santo quase irlandês, cerveja genuinamente irlandesa. É impossível contar a história dessa nação sem a menção de ambos. Seria uma violência irreparável.
São Patrício faleceu em 17/03 do ano de 461. A Guinness nasceu cerca de 1300 anos depois, em 22/09/1759. Passados 250 anos, em 2009, com intuito de comemorar o aniversário da marca, a Guinness decidiu criar seu próprio feriado, em homenagem ao fundador Arthur Guinness. Nesse dia, exatamente às 17h59, todo bom irlandês honra sua existência bebendo um copo da iguaria preta. Um gesto nobre de louvor e admiração.
Em tempo: a vida na Irlanda deve ser bem divertida.
A cervejaria Guinness, atualmente pertencente à inglesa Diageo, também possui uma história repleta de pequenos enredos entrelaçados que, ao longo de tempo, culminam na cerveja preta mais vendida do mundo. A bebida é produzida até hoje com a mesma composição: malte irlandês, água de Dublin, lúpulo e levedura. Fabricada em cerca de 60 países, possui cerca de 80% de participação de mercado na categoria de cerveja preta. Ao redor do planeta, 170 mil bares e pubs consomem 10 milhões de copos de Guinness diariamente.
Nem mesmo Sir Arthur imaginaria aonde seu sobrenome chegaria.
Obviamente, isso levou tempo. Nesse período, Guiness foi se tornando uma marca, algo maior que uma simples cerveja. E ouso afirmar que a história da propaganda também não pode ser contada sem que se faça referência a iguaria irlandesa. Seu primeiro anúncio foi publicado em 1794, por meio de uma gravura na revista “The Gentleman’s Magazine”. Na legenda, a frase: “Saúde, paz e prosperidade”, algo que certamente São Patrício aprovaria.
Depois disso, uma sequência de campanhas memoráveis, marcadas pela ousadia e adequação aos novos tempos. Seu primeiro slogan, “Guinness é bom para você”, fez um baita sucesso quando lançado em 1929. No início dos anos 1980, período que as coisas não iam tão bem para marca, a lendária assinatura foi proibida de ser utilizada pelos órgãos reguladores de publicidade nos EUA e Inglaterra.
Uma nova campanha publicitária foi criada por conta disso e alcançou o notável resultado de 87% de conscientização entre todos os adultos. E isso incluiu um vigário (certamente irlandês) em Londres, que colocou uma placa fora de sua igreja que dizia: “A piedade não é boa para você”. A campanha foi a principal responsável pela ressurreição da marca à época.
Muitas outras histórias enigmáticas marcam a trajetória dessa marca. É tudo que uma marca precisa ter para se tornar ainda mais uma marca. Até mesmo o inusitado pode colaborar nesse sentido.
Em 1951, de uma discussão ocorrida entre diretores da Guinness a respeito de qual ave de caça de rapina era a mais rápida da Europa – a tarambola-dourada ou a perdiz -, algo que na época era impossível de se comprovar por meio de bibliografia ou testes práticos, surgiu um livro.
Diante de tal questão existencial em relação à velocidade das aves, a Guinness decidiu ela mesma decidir a questão ao publicar um livro capaz de dar fim a tal disputa. Em 1954, a Guinness distribuiu 1.000 unidades de seu Livro dos Recordes como uma despretensiosa ação de marketing. Hoje, o Guinness Book detém o recorde mundial da série de livros protegidos por direitos autorais mais vendida de todos os tempos.
O inusitado é capaz de coisas inimagináveis quando se está atento a ele.
Que São Patrício abençoe todas as pessoas da Macfor e todos os acidentais leitores e leitoras dessa coluna. De preferência, com doses exóticas de Guiness.
Rumo ao centenário…
Ricardo Poli é professor, palestrante, provocador, piadista e colunista da BRING ME DATA.
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As opiniões aqui contidas são de responsabilidade de seu autor e não refletem necessariamente a opinião da Bring Me Data e do blog da Macfor.